Após minha participação no ENAMA recebi a seguinte questão:

“Bebês amamentados no peito por muito tempo têm atraso ou dificuldade no desenvolvimento da fala?”

A fala pode ser considerada a realização da linguagem, que é o nosso sistema de comunicação. Para que se observe o desenvolvimento de fala, o falante deve ter intenções comunicativas, conteúdos a serem expressos.

Nos primeiros meses de desenvolvimento, o bebê faz ensaios, “brinca” com seu aparato fonoarticulatório, interage usando gestos, sons e progressivamente palavras. A comunicação é uma atividade que se “realimenta” pela prática, ou seja, quanto mais nos expressamos, mais hábeis comunicadores podemos nos tornar.

A amamentação é uma atividade extremamente favorável para a boca e para a face, promovendo tanto a adequação da musculatura, quanto o crescimento ósseo ideal. Na amamentação, as funções de sucção (precursora da mastigação), deglutição e respiração ocorrem de forma coordenada, fazendo com que o “equipamento” que também funcionará para a produção de fala atinja as melhores condições.

A preconização atual, nacional e internacionalmente, é que a amamentação seja continuada ao menos até os dois anos de idade, momento em que se espera que a criança já esteja combinando palavras para expressar-se especialmente de forma oral. Assim, podemos questionar o que significa “amamentar por muito tempo”.

Atualmente é muito comum a sociedade se incomodar com a amamentação de bebês que já recebem alimentação complementar, ou que já andam, ou que já “cresceram”. Também é comum, infelizmente, que mesmo profissionais da saúde não saibam manejar os processos relacionados à amamentação, que são muito subjetivos e bem menos controláveis do que os processos envolvidos na alimentação com fórmulas. Por vezes, a orientação acaba sendo o desmame. Mais lamentável ainda quando tal orientação traz consigo argumentos ameaçadores e infundados, como o do atraso de fala.

Existem crianças amamentadas para além da fase “bebê de colo” que são superprotegidas, infantilizadas, regredidas, dependentes, inseguras, mimadas, ou que não tenham limites? Sim, existem. Como existem crianças amamentadas até (muito) mais de dois anos de idade que são autônomas, seguras, bem resolvidas, e apresentam desenvolvimento emocional, social, sensório motor, cognitivo, de linguagem e de fala dentro ou acima do esperado.

Porque a amamentação não é a única questão. A amamentação é um dos muitos instrumentos para a relação. As relações, sim, podem contribuir para atrasos. O desenvolvimento do indivíduo tem enorme relação com o ambiente que o cerca e com as experiências por ele vivenciadas. E isso se aplica para crianças em aleitamento natural ou artificial.

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